Por Lucas Orrico
Agosto, historicamente é um marco para o futebol mundial como o mês do desgosto. Coincidência ou não, as maiores tragédias futebolísticas mundiais se passaram nesse mês. No Brasil, ficou marcado a Guerra campal entre torcidas organizadas do Palmeiras e São Paulo no dia 20 de agosto de 1995. Esse mês também já proporcionou invasões de torcidas em treinamentos, protestos em aeroportos, agressões a jogadores, diretores e assim sucessivamente. Claro que os fatos não são exclusividade para o simpático mês de agosto e muito menos pro futebol brasileiro.
Essa moda começou a chamar atenção com o surgimento dos temidos Hooligans na Inglaterra, jovens de nível econômico alto e que sentem ódio e prazer em brigar com torcidas adversárias. O divisor de águas para a Europa foi a final da Copa dos Campeões da Uefa de 1985, torcedores da Juventus e do Liverpool ficaram muito próximos uns aos outros e a pequena quantidade de policiais não conseguiu conter a confusão. Ingleses foram proibidos de jogar torneios europeus por 5 anos. Saldo: 39 mortos.
De onde vem tanta fúria e violência gratuita, em um país considerado fair player? E dos outros países europeus até mesmo sem tradição alguma no mundo da bola? Ninguém sabe onde, quando e como surgiu. Só a História pode explicar.
Na Escócia a religião entra em campo no clássico Celtics e Rangers, o primeiro fundado por padres católicos que queriam homenagear os irlandeses e o segundo formado por protestantes. A população escocesa gostava (e ainda deve gostar) desses embates religiosos no campo, pois assim que a bola rolava quem era católico vestia-se de verde e branco, protestantes de azul e branco, logicamente cada um de um lado do estádio. Para se ter uma idéia desse fanatismo os hooligans do Celtics colocam em sua bandeira a imagem do Papa e apóiam um grupo terrorista irlandês: “Ira”! Já os do Rangers, de tradição protestante anglicana, colocam em suas bandeiras o rosto da Rainha da Inglaterra, cantam o hino do Império Britânico e apóiam o grupo terrorista Protestante: “Ulster”. Nem preciso falar das brigas dentro e fora de campo, né?
No ramo político Partizan Belgrado x Estrela Vermelha, cada time pertencia a um partido, Galatasaray x Fenerbahce, a briga intercontinental, o estádio do Fenerbahce localiza-se na parte asiática de Istambul e outro européia. Para um país tradicional na bola, tem Roma x Lazio na Itália, rivalidade que vem desde os tempos do Coliseu. Exageros a parte, a Lazio tem raízes fascistas, seu mais ilustre torcedor é nada mais e nada menos que Benito Mussolini. A maior parte da sua torcida concentra-se na burguesia romana, enquanto que a Roma finca suas raízes de uma união proletária, que tem como símbolo a loba que amamenta os irmãos Rômulo e Remo, gerando uma simpatia das classes mais populares. Dois times tão próximos geograficamente (dividem o mesmo estádio) e tão distantes ideologicamente são comuns ver manifestações e discriminações fascistas dos torcedores da Lazio.
Entretanto, Londres, a capital inglesa, com 7,5 milhões de habitantes chama a minha atenção. Um lugar onde a constante briga não é provinda de uma cultura religiosa, muito menos partidária. Cada time tem um histórico diferente do outro, seja de classes, raças e influências estrangeiras. Talvez uma briga territorialista. A verdade é que o DNA inglês está ligado ao seu time de coração.
Atualmente, constam 5 times londrinos na divisão principal, porém há outros tradicionais esquecidos em divisões inferiores. A rivalidade mais poderosa da Inglaterra não é Manchester United x Liverpool e muito menos o derby londrino Chelsea x Arsenal, e sim West Ham United x Millwall. Esse último clássico foi tema do filme Hollywoodiano em 2005, Green Street Hooligans com Elijah Wood, mostrando o futebol com sangue, álcool e violência. West Ham é um clube da primeira divisão e Millwall da terceirona inglesa (essa diferença de divisões até me lembra um clássico baiano).
Na Copa da Inglaterra (competição estilo Copa do Brasil da gente), iniciou-se o sorteio. Os pubs (uma espécie de boteco) da Zona Leste estavam apinhados de gente e quando as bolinhas apontaram no confronto deles, explosões de alegria, fogos e gritos de guerra. Guerra que dominava as ruas da Zona Leste, tudo começou com a rivalidade entre estivadores, simplesmente porque dois estaleiros, não tinham o mesmo horário de trabalho e com isso não formavam uma unidade de pensamento. Pronto, o arerê tava formado, uns funcionários fundaram um time e os outros do estaleiro vizinho, outro “team”.
Apesar da proximidade, eles não têm um grande histórico de confronto, muitas de suas brigas são formadas por emboscadas, invasões de pubs alheios com o velho e famoso coquetel molotov. O curioso é que não é comum o uso de armas de fogo nas tais brigas, eles usam da chamada“briga limpa”, no máximo uma arma branca.
Na Inglaterra, dia de jogo, é literalmente o DIA DO FUTEBOL. Começam a bebedeira desde cedo em pubs de suas torcidas, ecoando gritos, hinos e provocações ao rival do jogo. Eles realmente respiram futebol. Desde o lançamento do filme não se enfrentavam e uma guerra pré-anunciada iria acontecer (dessa vez sem o Frodo do Senhor dos Anéis). Reza a lenda que o filme ajudou (e muito) a reatar os ânimos, mas a verdade é que a própria polícia inglesa não deu muito bola pro clássico, logo a Inglaterra que hoje é o parâmetro de organização e segurança com rigidez em suas punições.
A junção do passado histórico, mais incentivo do filme, adicionado há quatro anos sem confronto, um emocionante 3x1 pro mandante West Ham (com prorrogação e tudo), restou: pancadarias antes e durante o baba (pra quem não for baiano, baba é a famosa pelada descontraída, que pelada descontraída não é uma mulher nua bem à vontade), um homem esfaqueado e invasão a cada gol do West Ham, o último gol com mais de duzentos fanáticos em campo.
A verdade é que os instintos primitivos do homem falam mais alto com certos estímulos. Agora um papo direto com o mundo masculino. Qual é o homem que nunca teve vontade de brigar ou praticar uma luta, depois de assistir Clube da Luta? Pois é, meu amigo leitor (e porque não leitora?), se você for daqueles que se deixa dominar pelo instinto mais primitivo, nem ouse assistir o filme, você pode ser o próximo a entrar nas estatísticas de violência do futebol brasileiro.
Notícia e imagens da confusão no clássico:
Vídeo da confusão antes e durante o jogo:
www.youtube.com/watch?v=LKBPeLfnCSQ&feature=related
Trailler do Filme Green Street Hooligans:
www.youtube.com/watch?v=EAe-1Lv1KYU&feature=player_embedded